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Petite Fleur

Petite Fleur

A REDE

Vivemos numa espécia de sono em que o sonho alterna com o pesadelo e em que corremos o risco de não distinguir entre ambos, tal a confusão gerada pelas ilusões com que os envolvem e que inviabilizam qualquer esperança de conhecero grau de identidade - se algum... que poderão ter com a verdade.

Aquilo a que chamamos "mundo" mudou muito, há já bastante tempo e de forma subreptícia e acelerada.

A "realidade", tal como a aprendemos e na qual decorriam as nossas vidas é hoje uma virtualidade. Nada, ou muito pouco, daquilo em que nos fazem crer, é real no sentido em que nos habituámos a identificar a realidade com a verdade dos factos.

E isto não decorre apenas da perversidade dos actuais ou potenciais detentores dos vários poderes, mas mas do modo como eles se relacionam entre si, numa vastíssima sociedade secreta que abarca no seu mutante secretismo todas as até há pouco consideradas "sociedades secretas". De vez em quando atiram-nos com uma nova "sociedade secreta" - caso de Bilderbeg - divulgada pelos próprios para que haja  um osso democrático com que se entretenham os povos enquanto a Grande Sociedade Secreta Mundial trata de coisas sérias, das que nem os seus membros ainda têm perfeito conhecimento mas segundo as quais visam, com a multiplicação dos meios de que dispõem - e que, curiosamente, são os mesmos de que dispomos mas acérrimamente vigiados e controlados pelas mais diversas instâncias desse obscuro Poder - criar um mundo que os satisfaça a todos. Pretensão grandiosa e impossível que, muito provavelmente, terminará numa guerra em que se degladiem o real humano e as virtualidades da técnica.

É frequente quando alguém menciona um facto socialmente mais transcendente alguém dizer: "Este anda a ver muita televisão... E, contudo, muito do que nos chega nas séries da Fox e em vários documentários que, "et pour cause", só passam quando quem trabalha já se recolheu, descodificam muito dos processos que conduzem a factos "inexplicáveis" com que a comunicação social nos confronta diariamente e para os quais, segundo os nossos valores e imagem que guardamos de uma realidadee que já não o é, não encontramos explicação. Impotentes, lamentamos a proliferação desses factos e seguimos em frente sem nos apercebermos dessa nova realidade e da virtualidade que é viver numa sociedade há muito extinta.

A verdade é que a WEB não é apenas uma rede de pescar que alimenta a publicidade, mas uma rede de prender,de malhas cada vez mais fechadas, onde cada um de nós é, sem que disso se aperceba, um nó em linha com uma infinita e incontrolável infidade de ligações. Somos, sem nos darmos conta, os mensageiros de tudo o que, de melhor ou pior, os que tecem a rede nos deixam capturar. E fazêmo-lo sem certezas, Apenas com suspeitas, porque o mundo deixou de nos merecer confiança e já nos habituámos a viver com isso.

Sabemos que enquanto escrevemos alguém nos vai lendo, que as comunicações de voz são quase públicas e mesmo gravadas, sabemos, porque a verdadeira realidade assim o exige, que, para nossa segurança, vivemos sob aturada vigilância. A liberdade, tão valorizada e proclamada como valor primordial, reduz-se à liberdade de um Charlie.

Daí a saudável necessidade de, por  uma questão de consciência, nos alhearmos do que apenas existe porque nos dizem, dos que  afirmam fazer opinião, dos que, manhosamente,afirmam ser seu desejo dar-nos espaço para pensar (como eles, claro!), dos que se pavoneiam de gravata roxa ou de qualquer outra cor no intuito de irem criando a sua própria rede, rede que, ignoram eles, será apertada pelas fortes malhas das circunstâncias.

O que se passou agora na Grécia, seja qual for o desfecho, foi a tentativa de um Povo que descobriu as virtualidades da inteligência de provar que há quem creia que a realidade, por pior que seja, ainda é possível. Aquilo é verdade!

 Por cá congregar-se-ão linhas partidárias, ideais, movimentos, circulos, e os habituais topa-tudo que nunca desperdiçaram um contacto e que, subservientemente, se disporão a po-los ao serviço de todas as causas. Porque já não é de ideiologias que se trata, nem sequer de ideais. É de Poder que se trata e daquilo que o alimenta. É essa a motivação que faz emergir insuspeitas colónias de prestáveis servidores.

Não é de espantar que a Religião regresse ao papel que sempre teve na vida das comunidades humanas. A Religião é, em si, a essência do transcendente, do que não precisa ser explicado nem útil porque é inerente ao Homem, iniciático e alheio a todas as entropias que os séculos e o conhecimento acumulem.

Magoa ver atacar qualquer religião ainda que não seja a nossa. Mais magoa assistir à falta de empenho com que defendemos a nossa! Como se tudo se reduzisse à tolerância, ao acolhimento do inimigo, à prática programática - e tantas vezes duvidosa - do bem, a duas ou três das vinte e quatro horas  do dia a pedir ou a agradecer a Deus. Que se passa nas outras???  

LE MONDE EST EN TRAIN DE DEVENIR UNE MERDE!

O título vai em francês, a lingua de "Charlie", para dar um ar mais culto ao tema e, para cheirar menos mal, acrescente-se-lhe um perfume YSL. Infelizmente, nada disso poderá alterar a repelência contida nesta triste realidade!

Pus-me a pensar - penso muito (é de graça..), vejo notíciários e leio jornais e revistas de todos os países cuja Língua conheço - e, depois de muito meditar cheguei à conclusão que já não vale de todo a pena pensar em termos de "Mundo", "Humanidade", "Universo"e outros conceitos que na sua vastidão envolvem uma imensidão de subsistemas através dos quais chegam às nossas vidas e nos dão cabo do sistema nervoso. 

A verdade é que já não vale, de todo em todo, a pena termos a pretensão de mudar o mundo e nem sequer a de alterar o que  nos vêm querendo fazer crer - os que julgam que mandam,  apesar de também eles estarem enganados...- que depende de nós. Já nada  depende de nós, seja qual for o "nós", há que tempos| A única coisa que podemos e devemos fazer é abstermos-nos de tudo aquilo que, em termos de justicações estatísticas, sirva para apoiar as breves e arriscadas ilusões de poder com que brincam alguns indivíduos e as cadeias de subserviência e ausência de escrupúlos que os apoiam.

Aquilo em que pensamos quando falamos de "mundo" está fora de todo e qualquer controlo, e aquilo a que assistimos é à busca feroz e incessante em que povos, raças, tribos, classes e instituições se empenham para encontrarem os seus caminhos e demarcarem as suas áreas.

Daí que a tão amada palavra "democracia" - um conceito que inocentemente os gregos inventaram e onde tem cabido tudo o que a contemporaneidade lhe tem querido meter dentro - comece a perder terreno em favor do "delivering", conceito mais inclusivo mas incomparavelmente mais difícil de promover em qualquer das suas várias vertentes. Resumindo: a globalização no seu melhor,  propondo-se como solução a um mundo onde tudo caminha em sentido contrário, em que as convicções de pertença estão cada vez mais presentes e arreigadas. Não vai dar! Ainda que seja a ONU a vendê-lo! Não vale minimamente a pena levar isto mais a sério do que às comissões de inquérito com que por cá a oposição entretem o tempo.

Outra coisa de que é urgente abstermo-nos é de tudo o que for feito para "as massas": programas de Tv, festivais, concursos, "futebóis", telenovelas, etc.. Tudo isso visa criar-nos preocupações fictícias que nos impeçam de pensar em temas que, se pensados, tornariam turbulentas "as massas" - reacção altamente improvável em povos de brandos costumes - e nos mantêm entretidos enquanto "eles" (sejam quem forem "eles"e pelo tempo que forem) se entretêm com o exaustivo jogo de nos enganarem a nós, se enganarem uns aos outros, enganarem-se a eles próprios.

No meio de tudo isto começa a ser importante ter em conta a "inteligência artificial" que, não sendo propriamente uma novidade - já se trabalhava nisso na Alemanha dos anos trinta e já está presente há muito em diversos utensílios mais ou menos sofisticados do nosso quotidiano, embora sem tão científico título - começa a assumir tarefas bastante mais "invasivas" nas nossas vidas, na medida em que pode ser utilizada por qualquer estúpido a quem sejam fornecidas instruções comportamentais que ponham a máquina a agir como gente.

O tema, que tem vindo a ser tratado com alguma preocupação em vários media, comporta riscos vários para populações indefesas e desconhecedoras dessa possibilidade. É o caso do acompanhamento de pessoas sós, doentes, idosos, pessoas de todas as idades com grande necessidade de interrelação, como os quase obsessívos frequentadores da web. Respostas psicologicamente estudadas para os diversos perfis e necessidades poderão ser automatisadas e, para o bem ou para o mal, viajarem pelo espaço sem que seja possível atribui-lhes uma responsabilidade pessoal. Estudado, ou escolhido, um determinado perfil é possível ganhar a confiança dessas pessoas através das respostas adequadas aos seus desejos ou preferências. Isto, parecendo não ter grande importância, pode ser altamente nocivo, inclusivamente no que respeita comportamentos sexuais com menores - é tão possível ser pedófilo através da net como em contactos físicos... - já que do discurso erótico ao discurso sexual vai uma ténue distância que as pulsões se encarregam de eliminar. Acresce que a coisa funciona, ainda que independentemente da imagem real, que ganha contornos ideais na imaginação do outro. Um moço atarracado, com o estomago a cair-lhe por cima do cinto ou uma rapariga despida do comum dos atractivos, podem ser jovens esbeltos e dotados de toda a espécie de atractivos para quem com eles se envolve numa relação que só é virtual devido à ausência sensorial, mas com uma intimidade que se solidifica e aprofunda, com todos os riscos que a habituação comporta. Abstenhamos-nos de amizades e "likes" com desconhecidos nas redes sociais.

Mais complicado, ou não menos perigoso, é o desenvolvimento celular da robótica que, teme-se, poderá acabar trabalhando contra os homens...como, aliás, tantas outras invenções subsidiadas pelos que têm capacidade financeira para o fazer e esperam por essa via dominar o mundo.

Aos drones, e às balas inteligentes que matam os homens mas poupam os edifícios, seguir-se-ão soldados/robot e outros do género que um dia darão aso a que se possa ser assassinado por um robot não identificado que não deixa impressões digitais nem sinais da íris, nem qualquer humano vestígio.

Posto isto creio que o que devemos fazer é vivermos como nos acostumámos a viver quando as nossas únicas ocupações eram a nossa vida e a dos nossos, quando a solidariedade se chamava caridade e ninguém fazia dela modo de vida, orientados pelas regras do Direito Consuetodinário, ouvindo as "nossas" músicas, sejam elas quais forem, mantendo os nossos hábitos de vida, especialmente os que não custam dinheiro, selecionando relações antigas, evitando confundir conhecimentos com amizades, e evitando até ao limite do possível a dependência das instituições, fontes de desorientação e descrença.

A privacidade - ao contrário do que se apregoa por razões de marketing comercial - é hoje o maior dos luxos! 

Não alimentemos mais ilusões sobre o mundo apregoado nos desejos, intenções e conselhos dos internautas! Nada daquilo existe, ou existe apenas como raridade. As pessoas que os enviam podem até acreditar neles mas está à vista que apenas uma infíma minoria os praticará.

A verdade é que os mais velhos não aprenderam nada com a História e os mais jovens podem até saber muito de informática e serem experts nas suas profissões mas desconhecem-na, porque a História vende mal e não gera lucros.

Num mundo assim só nos resta retirarmo-nos! E fazê-lo honrando a Vida, permanecendo no pleno gozo de tudo o que ela nos proporciona apesar da intervenção multiplicadamente negativa dos homens.

   

A SUBLIME IGNORÃNCIA

Vem isto a propósito de uma ida a uma estação dos Correios para registar uma carta. Havia uma fila grande gente à minha frente e isso deu para observar todos os produtos que por lá estavam expostos. Espantou-me a quantidade livros e, especialmente, a qualidade "didáctica" com que se apresentavam. Todos, sobretudo todas, tinham conselhos a dar sobre a educação de filhos, ainda que fosse através da Astrologia, sobre os diferentes modos de encarar a vida nas suas diversidades e adversidades, sobre o amor, sobre tudo o que lhes vem à cabeça quando lhes dá para escrever. Mulheres decerto inspiradas pelos exitos que terão tido como mulheres ou como mães, o que lhes confere a missão de orientar as outras  nesses caminhos.

 A verdade é que ali estavam  prateleiras e mesas  cheias de conselhos - muito provavelmente insuflados em anos de psicanálise... - apelando ao lazer dos eventuais "clientes", num lugar onde seria de bom-senso e de bom gosto expor os nossos grandes escritores que, no meio desta avalanche de literatura que não tardará um ano sem que seja vendida a peso como papel para reciclagem, se distanciam cada vez mais do convívio com os leitores. Nomes como Eça, Aquilino, Raúl Brandão, Camilo, Paço d' Arcos, Ramalho, Pessoa - este, talvez pelo isoterismo que o envolve, reservado a tertúlias pessoanas - Pascoais, Fialho, e tantos outros grandes escritores e poetas de Língua portuguesa que são lidos em todo o mundo e que ficariam bem nos escaparates convidativos das estações de Correios. Acresce que o funcionário que me atendeu me deu conta da disputa levada a cabo por escrevinhadores e editores no sentido de os seus livros ocuparem os lugares mais chamativos. "Um inferno!".

A verdade é que escrever já não é mais uma actividade lúdica! Poucos são os que ainda escrevem cartas das que eram segredos sobre pensamentos, lugares ou sentimentos directos ao coração dos Amigos, e creio que  menos ainda aqueles que mantêm um diário onde se vão dando conta do caminho percorrido, das suas esperanças, contradições, alegrias, desilusões. Hoje, apesar dos queixumes colectivos, toda a gente diz considerar-se heroicamente feliz ou em vias de o ser, e acha que deve partilhar esse estado de espírito - se tal se lhe pode chamar...- com os "infelizes" que, partindo da generalização do colectivo, andam por aí perdidos  "à la recherche  d'un heureux conseil".

Acontece que a edição tornou-se um modo de vida dos mais rentáveis e com menos empate de capital. Não me refiro, claro, aos Editores com um lugar já consagrado que nos leva a confiar no editado, mas a uma máquina editorial que se serve de tudo o que apareça escrito, desde um slogan de parede aos muitos textos, melhores ou piores, que circulam nas redes sociais. Tudo serve de inspiração a um qualquer "argumentista" que pega na ideia, dá uma volta ao texto para não parecer plágio, tira metade de um comentário do Face e completa-o com algo semelhante que leu no Twitter, recorre às estatísticas para conhecer a medida de "gostos" que merece, e temos romance! Caso valha a pena, põe-se o tradutor automático a funcionar, acrescentam-se na página de edição os nomes de dois ou três amigos como tradutores e revisores, e, caso o escrevinhador se ponha com exigências, pede-se a uma Editora que o aceite como subcontratado para ter direito a um lugar num livreiro.

O mesmo se passa com as publicações de imagens postadas nas redes sociais  que, diga-se, se bem escolhidas dão ricas capas a pobres livros. Melhor ainda se "os business angels" forem chamados a colaborar através do aperfeiçoamento dos desenhos gratuitos  dos internautas. Um negócio primorosamente montado, que não tem nada que o confunda com cultura, uma escrita feita pela máquina e para a máquina, a ciência da ficção em que, creio, o único que poderá ter algum encargo é o escritor desejoso de se ver publicado e aceder assim ao estrelato de um escaparate de um qualquer lugar de venda de jornais e revistas ou, se for bem relacionado, conseguir que um incauto empregado do livreiro lhe coloque o título entre os "top" mesmo que ninguém ainda o tenha comprado.

O panorama cultural português empobrece todos os dias! Seja sendo vítima de expedientes que banalizam pela quantidade o que deveria optar pela qualidade, seja, no inverso, pela falta de escolha de qualidade que os canais nacionais - os únicos a que a maior parte dos portugueses têm acesso - proporcionam. Alem dos noticiários - repetitivos, arrasadores de esperança ou vendedores de mensagens consideradas politicamente corretas pelos emissores - os programas são de uma impressionante miséria e vivem seja de uma espécie de lotarias telefónicas  que muitos acharão convidativas, seja das oportunidades que são dadas aos participantes dos vários programas de gozarem o seu quarto de hora de glória.

Acontece, como vi hoje num qualquer noticiário, Catarina Vaz Pinto - mulher de Guterres? - dar-nos conta de algo interessante que tem que ver com o nosso passado, ainda que tratando-se da Sinagoga de Amesterdão, datada do sec. dezasseis, mandada construir pelos judeus portugueses e primorosamente conservada. Nisso se perdeu, contudo, a oportunidade de dizer que essa riqueza se ficara a dever à exploração das minas de diamantes e outras pedras preciosas levada a cabo pelos judeus no Brasil, com mão de obra angolana e guineeense, durante mais de um século, e que era comercializada na Holanda onde se concentravam os maiores lapidadores de pedras preciosas. Portugal, como sempre, pouco ganhou com isso. E o mesmo aconteceria com as minas de diamantes de Angola... 

A verdade é que ninguém fala de nós! A preocupação com "a imagem" não deve inquietar-nos. Não há jornal ou revista estrangeira que se lembre que existimos, a menos que se trate de Ronaldo - com menção nas páginas centrais no ABC de Madrid -, ou do ex-misnistro Arnaud por algo que envolve as relações da política com a Banca internacional,  com o BES pelo meio

 

RÉCITS DES TEMPS

Nestes tempos em que parece que tudo acontece mas em que, de facto, não acontece nada, vem-nos um certo apetite de darmos uma voltinha pela grande História da desfalecida Civilização Ocidental e procurarmos entender, na modéstia das nossas capacidades, esta longa sequência, eivada de desvios e reencaminhamentos, de medos e ousadias, de superstições que acabaram sendo determinantes e tidas como sinais que por vezes parecem estar para lá do humano.

Vem isto a propósito de um facto que sempre me intrigou e ao qual nunca ninguém me deu uma resposta satisfatória: que razão terá levado D.Luís e D.Maria Pia a baptizarem o seu filho primogénito e presumptivo herdeiro com nome de Carlos, nome jamais constante na longa lista de mais de seiscentos anos de monarquia que Portugal já levava? Curiosamente, ao contrário do irmão, a quem foi dado o nome de Afonso Henriques, D. Carlos não tinha na enorme lista de nomes que a sua real pessoa comportava, muitos dos quais - se não todos... - remetiam para significados e ligações familiares ou religiosas que decerto os estudiosos saberão explicar, nenhum dos nomes tradicionalmente usados em qualquer das dinastias!

Não se tratando de um herdeiro por acidente, como foi o caso de seu Pai, a escolha é algo intrigante. E ainda mais intrigante se torna quando  procuramos este nome na história da Europa, ou seja, quando nos confrontamos com "a importância de se chamar Carlos" em qualquer dos idiomas em que quer o poder político e religioso, quer as desgraças da Europa, se registaram para a posteridade.

A Carlos Martel, o rei  Merovíngeo que no século VIII salvou a civilização cristã e o Ocidente da conquista muçulmana, segue-se Carlos Magno, fundador do Sacro Império e da dinastia Carolíngea, imperador que se empenhou em libertar o papado do poder de Bizãncio e que, mesmo não sendo as suas relações com o papa Estevão II as melhores, o apoiou , em 756, na fundação do que viriam a ser os Estados Papais.

Depois de uma longa Idade Média a Europa cristã ressusge com o Carlos Borromeo , arcebispo de Milão, um homem da Renascença que põe especial empenho na educação do clero com a criação dos primeiros seminários e a promoção de sínodos diocesanos e de escritos catequéticos e de divulgação da doutrina católica.

Posto isto, CARLOS surge como o nome que mais se identifica com a determinada defesa da Igreja de Cristo mas que parece esgotar-se em si, transformada a acção dos seus detentores em insuportável e frragilizante fardo para os que lhes sucedem.

Curiosamente o nome, a que se associam tantas glórias da civilização ocidental,  tem associadas, a partir de determinada altura, uma série de tragédias que vão desde os malfadados Stuarts aos banidos Carlistas nossos vizinhos, passando por várias figuras reais que se tornaram personagens romanescas.

No Vaticano, Karol Woijtyla preferiu adoptar para a posteridade o nome de João Paulo II  a ficar como Carlos, o seu nome de baptismo.

E veja-se:  o que a tudo isto me trouxe foi, afinal, o facto de o único rei Carlos que tivemos - sei lá eu porquê! - ter sido protagonista de tão injustificável tragédia que, na realidade, foi o epílogo da Monarquia em Portugal.  

THE "SECOND LIFE"

Não faço ideia de quantas pessoas terão passado pela experiência de lhes ter saído na rifa serem escolhidos para parceiras da "Second Life" de alguém. Para os que não conhecem aqui vai o relato de uma experiência inesquecível vivida por uma pessoa que desconhecia a existência de tal "união".

Um protagonista de uma "Secon Life" é, segundo a minha experiência, "alguém"(?) que nos conhece suficientemente bem para entabular conversa interessante connosco e, parte infinitamente complicada, fazê-lo sob os mais variados nomes.  A única coisa que nos leva a identificá-lo como interlocutor é a sequência das conversas, a continuidade dos temas, o estilo. É, obviamente, alguém que nos conhece suficientemente bem para conhecer factos da nossa vida, gostos de literatura, música, a nossa opinião ou interesse por determinados temas, um mundo de coisas que mostra que é alguém do nosso círculo de relações. Faz-nos uma certa confusão que nunca se identifique mas o mistério traz também um certo encanto a uma conversa amável, solta e descomprometidas pelos temas que gostamos de comentar ou discutir. A coisa pode arrastar-se assiim, entre músicas, textos e poesias durante mais de  um mês. Até que de repente começamos a receber pelo meio textos com sugestões a roçar o indecente. Aí, como o estilo mudou e os nomes - às dezenas! - não nos dão qualquer pista, começamos por pensar que alguém entrou sem autorização no nosso espaço. A dúvida não dura muito tempo: os textos começam a rarear e a ser substituídos por imagens , umas absolutamente obscenas outras  imagens indescritíveis  a preto e branco onde sobressaem bocas escorrendo sangue, mulheres esfaqueadas. coisas de filme de terror à mistura com feitiçarias medievalescas. Por essa altura começamos a hesitar em abrir mas algo no diz que a pessoa é a mesma. A coisa complica-se quando o personagem nos comunica que passou por nossa casa às tantas da noite e que estavamos a "ouvir música de jazz numa luz difusa". Era verdade! Conclusão: o sujeito dos mil nomes não só nos conhecia como andava por perto. Não vou falar de suspeitas, que foram várias. Vou apenas dizer que, por tudo isto, e por ameaças que se seguiram quando comecei a exibir as minhas suspeitas, comecei a excluir partes. Adiante.

Não se imagina o que uma situação destas pode ter de incómoda! Porque não compreendemos como pudemos deixar-nos apanhar naquilo, porque começamos a ter uma necessidade premente de saber quem faz aquilo e como é possível usar aquela quantidade louca de nomes e andarmos nós no meio de tudo aquilo sem saber de quem se trata. O recurso foi, obviamente, o bloqueio sucessivo dos nomes com recurso à Microsoft. Tantos foram os bloqueios - terão ultrapassado o milhar.. - que "alguém" foi denunciado e bloqueado, ainda que possa ter acontecido haver pelo meio uma vitima inocente, talvez proprietário do computador de que o misterioso personagem se servisse.

Quanto ao acesso a tantos- mas tantos! - nomes não é complicado. Bastava que o/a personagem fosse administrador de inumeráveis grupos e comunidades que aparecem nas barras a convidar-nos, com temas mais ou menos aliciantes, a ingressarmos neles com o nosso endereço - Mais um... Se a pessoa tiver um grande núcleo de conhecimentos, se tiver conhecidos nos sites, se for de uma incrível criatividade na criação de grupos, estiver treinado na captação de nomes e, acima de tudo, se estiver acima de qualquer suspeita, o melhor mesmo é por o asunto num cofre na Torre do Tombo e esquecê-lo lá!. Para memória futura... E, quanto ao seu verdadeiro nome, o de raiz, só mesmo lá muito longe será  talvez possível encontrá-lo.

NÃO ENVELHEÇAS! SÊ ANTES FELIZ!

Apesar de haver muita gente doente ou à procura de doenças, o certo é que os médicos, especialmente os que apontavam para determinados alvos sociais, não estão em fase de muita procura. As pessoas estão a começar a ir ao médico quando estão de facto doentes - geralmente quando estamos doentes, por muito distraídos que sejamos, damos por isso...-  ´porque a complexidade da vida pouco espaço lhes deixa para se entregarem a banais doenças e, ainda menos, para ver se descobrem alguma. Só os velhos, curiosamente, têm esse amor à vida. Os outros, os de meia-idade, já só se dispõem a fazer "check up" quando muito instados ou, também acontece, quando pensam residir no corpo o mal que lhes afecta a alma ou encontrar aí um desvio para as suas preocupações existenciais.

O facto tem levado a que certos médicos do tipo  "faishonable" - os que procuram criteriosamente os seus nichos de mercado - se vejam por vezes obrigados a um oportuno "upgrade".

Vem isto a propósito de um médico convidado - não sabemos se a pedido do próprio se do apresentador...- para dar a conhecer as suas descobertas no campo do envelhecimento, em um daqueles programas populares com que as televisões preenchem o tempo dos que o têm. calhou-me te-lo e divertir-me a vê-lo.

O médico, sujeito bem apessoado, bem falante e portador de um nome reconhecível entre a "boa sociedade", trazia com ele um Zézé, já por demais conhecido nem sempre pelas melhores razões, que se dispôs, em prol do marketing, a exibir fotograficamente, em boxers, a sua triste figura antes de se ter deparado com a competência do miraculoso médico, e uma segunda na qual tinha, ao que deixou no ar, perdido, além do peso de massa corporal, o peso dos anos.  E tudo graças ao doutor que, após ter explicado os motivos que o tinham levado a deixar a área das drogas  por ter concluído, ao fim de vários anos de proveitosa clínica, aquilo que qualquer inspector da Polícia com esse sector a cargo já lhe teria dito há muito, ou seja, que o combate à droga passa pelo combate à rede de produtores, traficantes e consumidores. Desgraçadamente as próprias famílias também terão chegado há muito a essa conclusão e percebido que, por mais doloroso, é mais fácil aprender a conviver com o facto do que desgastar-se na cura de situações maioritariamente irreversíveis.

Inteligentemente, o doutor abraçou o mercado onde se situa a clientela mais numerosa, predisposta, e com mais meios  financeiros para tentar o sucesso - o que não acontecia com os drogados  que constituiam uma terrível sobrecarga familiar de despesas que se adicionavam aos expedientes das exigência do consumo - , ou seja: O ENVELHECIMENTO.

Um regalo ouvi-lo, porque o doutor não descurou nenhuma das vertentes afectadas nem o perfume  da sedução no que propunha, com grande simplicidade, para as conter.

O retardar do envelhecimento vai, segundo ele, desde o controlo do peso - aqui nada de novo porque este parece ser hoje um dos flagelos sociais que afecta mais a sociedade que os próprios, alguns com experiência de antepassados obesos que terão "falecido" proximo dos cem anos - , controlo conseguido com espantosa rapidez, a avaliar pelo ZéZé junto, mas também por um desejável emagrecimento da consciência, "objecto" que, segundo um franciscano meu amigo, não deveria existir. O doutor também propunha isso: deitar o passado para trás das costas deixando lá ficar tudo o que pudesse perturbar a consciência - creio ser isso o que os políticos, auxiliados pelos juristas,já aprederam há muito a fazer sem precisarem de recorrer ao médico - , iniciar um presente limpo de post-ocupações, um presente feliz virado para um futuro cuja principal preocupação fosse concentrarmos- nos numa motivação que nos faça felizes. Enfim, ter a FELICIDADE como lema, caminho e meta.O hedonismo como modo de vida, numa época em que a felicidade se mostra tão exigente, e com receituário privado.

É óbvio que, num tempo em que a felicidade - a felicidade a sério e não alienações em compatibilidade com a bolsa ou com a amoralidade  - se ausenta com bastante frequência da vida das pessoas e das comunidades, o apelo é extremamente atractivo! E o segredo, se tal se pode dizer, reside no ESQUECIMENTO!

"Varridela" para os que praticam o mal com o gozo que lhes dá poder praticá-lo, se possível mascarado de bem; "conselho" para que os que são dele vitimas esquecerem tudo o que lhes aturaram, a destruição das suas, horas, das suas vidas, dos seus países, dos seus valores, dos fundamentos da sua fé no mundo, etc.. 

EMAGRECER E ESQUECER! Eis um remédio simples e, tendo em vista o Zézé, de resultados garantidos. 

Corremos o risco de voltar a engordar - Christina Onassis, com todos os seus milhões, foi um harmónio...-  ou de à hora da morte, como parece ter acontecido com empedernidos ateus, termos um rebate de consciência, com a dúvida pendente entre o perdão e o castigo. Mas nessa altura quem se lembrará daquele médico?  

A CULTURA DO FEIO

Tudo aponta para que estejamos a assistir ao fim de uma Civilização que foi conformando o mundo à sua imagem e o foi liderando segundo os seus conceitos por mais de dois mil anos. Á requintada e socialmente organizada civilização do Mediterrâneo, seguiu-se a  civilização atlântica, mais mercantilista e vocacionada para a supremacia do ter sobre o ser na consolidação do Poder.

A grande dispersão que se seguiu, ora atropelando, ora absorvendo a grande maioria das culturas por onde passou, teve também o reverso: vestiram-se povos autóctones enquanto que os colonizadores se iam despindo cada vez mais, artistas como Picasso encontraram inspiração estética em raízes africanos, e muitos outros factos será sempre possível mencionar, pese embora a relutância com que a actual "civilização ocidental" - ela também reduzida já a um mero conceito -  aceite a origem desses fenómenos.

No campo da Estética a Civilização Ocidental foi grande devedora da harmónica e insuperável divina proporção da estética grega. A verdade é que os gregos tinham a seu favor, para além de uma organização social que favorecia o lazer e, consequentemente, o puro pensar - sem outro objectivo que não fosse o pensar-se e interrogar-se sobre o pensado -, beneficiava de condições geográficas em que a Natureza se apresentava no mais belo e requintado estado de pureza. A leveza do céu, de onde emerge uma luz branca que proporciona doces variações tonais, a transparência dos mares, a quietude das ilhas, a beleza consciente que inspirava a vida das suas gentes, tudo concorria para que fosse possível a invenção de um Olimpo povoado de deuses com características humanas , quer amistosas quer guerreantes, que a sua condição de divindades avolumava. Mas em tudo imperava o culto do Belo e a razão da sua origem e aceitação. 

Foi essa a estética que orientou as nossas artes pláticas e, porque a visão é talvez o mais imediato dos sentidos, marcou as nossos gostos. Levámos séculos - por que não dizer: milénios - a "curtir" a beleza nos moldes em que tinha vindo a ser transmitida e usada , quer na concepção física do divino, quer na nobreza que aportava a descrições, estátuas e bustos dos heróis na diversidade dos seus campos.

O abandono do culto do Belo -tal como o reconhecemos e adoptámos, inclusivamente na Moral ,onde o Bom e o Belo se confundiam (não era concebível aceitar como belo um acto imoral ou amoral, associando-se desde logo o Mal à fealdade das bruxas e a beleza à serena bondade das fadas)  - tem, dentro do abandono e rejeição do contexto civilizacional do Ocidente, tido conseguido um percurso rápido. De repente o Belo, que começara a identificar com o "luxo" devido a uma opção quase exclusiva das élites, ultrapassou a decadência que enfermou todas as outras áreas de culto da sociedade dita ocidental. E, o que até então tinha sido considerado feio, passou a ser visto como uma discutível opção, que tanto poderia ter como conteúdo esse como o seu contrário. E, assim, chegámos onde chegámos!

Hoje, vendo o anúncio de um livralheco de banda desenhada - que, ao que parece, ainda que em versões mais saudáveis, entrou tristemente em moda e há que não perder a "onda"...- concluí que o mau-gosto deixara de ser apenas uma fatalidade e se propunha começar a fazer escola. O "album" - anunciado! - irá reproduzir-se e tratar o tema que lhe serve de título: "Um casal vulgar". E, creiam, é de vulgaridade que se trata! A capa - da autoria de um "gólfista"desenhador- apresenta o casal. Uma mulher avarinada, sem idade, de cabelo no ar e seios pendendo sobre onde se supõe seria a cintura, fugindo de um homenzinho entradote, atarracado, com um olhar espantado por detrás de grossas lentes, calças em saca-rolhas e o ar de quem ia saltar para cima da mulher que o mirava em fuga e violá-la...caso ela quisesse.

Apresentar assim um casal, por mais vulgar - subentendendo que a intenção é falar de um casal tipo - inclina-nos mais para um "casal ordinário" (será que o título foi escolhido em francês?) do que para ideia que temos de um casal normal, por mais simples e provinciano que o pensemos. Tudo ali é feio! Pode ser que na página dez, Deus se tenha compadecido deles - e dos leitores - e lhes um bebé bonito como o são todos os bebés, que se fosse vida real, teria que arcar pela vida fora com aquelas inóspitas criaturas. 

Isto, porém, é um fait divers. Ninguém é obrigado a comprar o album e poderá sempre deitá-lo fora ou usá-lo parcialmente para outros fins. O problema é que o "estilo" rompe barreiras onde a solidez do Bom/Belo se fragiliza. Temos hoje uma geração como talvez nunca tenhamos tido: jovens altos, escorreitos, conservando os traços de famílias bonitas de onde vieram, de  uma agradável politesse, alinhando na vulgaridade apenas quando não desejam passar despercebidos. Distinguem-se mesmo em farrapos porque até os farrabos neles são bonitos. Mas temos também, num crescendo, um prazer da extravagância que choca mas que cabe na regra de ouro deles em que "o que importa é ser feliz". O desmazelo, que aliás sempre foi atributo das famílias feias, como que querendo acrescentar algo que mostrasse que eram assim por opção e não por fatalidade, tornou-se um complemento de vida que por vezes se confunde erradamente com a falta de asseio.

É certo que nem todos os homens podem ter metro e meio de pernas, mãos musculadas, narizes aquilinos, e uns belos olhos resplandecentes, tal como nem todas as mulheres podem ter figuras esguias, belas cabeleiras, ollhos bonitos, pele de pessego, e um andar flutuante. Cada um é como é em cada uma das fases da vida. Mas fazer o elogio do feio, celebrá-lo, como se uma mulher  desaustinada e um homenzinho de perna curta, narizinho de boneco, mãos de donzela e olhos piscos fossem uma maioria de tal modo que nem se desse por que eram assim, será demais.

Num mundo em que tudo é feio, desde o modo de estar e se exibir, até ao baixo calão - a procolália invasora - passando pelo insuportável elogio em causa própria, como se cada um de nós fosse seguidor/praticante de Kant e desejasse que todos nos comportássemos como eles, vai uma cada vez menor distância. E isso, juntamente com a estranha lição de liberdade que pôs a "europa" em alvoroço e serviu de banquete a uma comunicação social que vai levar tempo a mastigá-la, a menos que outros actos libertadores se imponham, e que repete ad infinitum os acontecimentos, com a banalização do sagrado, com o desprezo pela privacidade, com um oportunismo sem pátria nem dono, com uma ânsia de poder que visa apenas o bem de alguns em "off" e lamentando em "on" a situação dos que não podem e não têm, não nos conduzirá - como às vezes possa parecer - a uma nova versão da Idade Média. Porque temos um tronco sólido a que falta uma cabeça.

A verdadeira beleza, inspirada como sempre na beleza da Criação, surge agora na retoma das culturas africanas, com as suas belas mulheres e homens atléticos, que se dispões a revitalizar as suas tradições. O interesse pelo que deixámos vai-se perdendo. Quanto às grandes civilizações orientais com quem traficamos, fazendo embora a cortesia demostrar um agrado, não descuram, bem o sabemos as suastradições e padões de beleza que pasam pelos jardins e por coisas aparentemente tão insignificantes como o momento do chá. São SIM! 

UM ESTADISTA - ALBERTO JOÃO À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA!

Passados quarenta anos Alberto João Jardim sai por decisão própria  do lugar que ocupou brilhantemente como Presidente do Governo Regional da Madeira!

E fê-lo com grandeza! Nem todos os governantes têm o dom de acertar com o timimng exacto em que devem dar lugar a outros, especialmente quando têm vitórias garantidas e não o fazem por cansaço, velhice ou doença, nem sequer porque pensem abandonar a vida política.

É certo que Alberto João tinha - e continuará decerto a ter - um jeito muito próprio, que desagradava aos continentais do "quadrado" , que, venham de onde vierem, se julgam ainda células do Império que já fomos. Alberto João soube sempre lidar com essa desajustada e ridícula sobranceria. O que lhe importava era dar à sua linda e tão carente Ilha o estatuto que a sua gente e a sua beleza mereciam. E fê-lo.

A Madeira que Alberto João transmite ao seu sucessor, aparte a beleza natural, nada tem que ver com a Ilha em que pegou, em que aparte meia duzia de famílias, os turistas eram reis e tudo se passava como se a Ilha inteira existisse para os servir. Alberto João, sem nunca afastar a noção de que o Turísmo era o cerne da economia da Ilha, soube usá-lo para dignificar os que por lá viviam, muitos deles em lugares praticamente inacessíveis, outros em alguns lugares onde a miséria se instalara em todas as suas versões e adquirira um conformismo que parecia não ter mais remédio. Alberto João preocupou-se essencialmente com essas pessoas. Criou uma rede de transportes que permitiu que todos tivessem acesso ao Ensino. Dito aqui e pensando nas "conquistas de Abril" pode parecer pouco. Mas não o é para quem conhece a Ilha e as suas povoações escavadas na rocha.

É certo que para o fazer, para abrir caminhos que não fossem apenas para os turistas desfrutarem as vistas mas vias para quem ia estudar ou trabalhar, abriu estradas que nos podem parecer um exagero, consentiu que se construísse em terrenos pouco seguros  para que os aglomerados que se amontoavam em lugares como Câmara de Lobos passassem a ser famílias e a ter as suas casas. Não terá conseguido tudo porque quer a Natureza quer os homens criam obstáculos que o tempo não consegue ultrapassar.

Nunca ouvi Alberto João falar dos pobres ou queixar-se da pobreza. Não teorizava; fazia! E fez muito! Levou electricidade a lugares onde nem esperança havia de que ela lá chegasse e deu a mão a muita gente que considerou ter capacidade e fidelidade para o ajudar na tarefa que se tinha proposto realizar. Poderão dizer que era isso que o levava a ganhar eleições, mas a verdade é que com aqueles ou com outros ele ganharia sempre de tal modo se soube identificar com a Ilha e com as suas muitas idiossincrasias de toda a ordem, nem sempre fáceis de conciliar num meio pequeno e fechado. A verdade é que não foram apenas as belíssimas instalações hoteleiras que acrescentaram fama à fama que a permanência inglesa deixara. Tem optimos estabelecimentos de Ensino e espaços gimno-desportivos, culturais e de convívio que satisfazem todas as classes sociais.

Não creio que, para além de alguma "bilhardice", se a houver, haja alguma coisa a apontar a A.J.Jardim. Se houvesse, com as oposições que cá e lá, embora por razões diferentes, pretendiam derrubá-lo, isso já teria sido aproveitado e usado ao estilo actual de fazer política. Dizem que é um ditador, que abusa da autoridade. Talvez! Mas é um autoritário com cabeça e plenamente entregue ao compromisso que assumiu quando se propôs governar a Ilha. Foi, digamos, o que nos faltou por cá...

Vinculado ao PPD-PSD desde início, foi responsável por todas as vitórias do partido. E os difeentes "leaders" tiveram sempre a consciência disso e sabiam que ele sabia que eles sabiam e, como seria de esperar, tirava partido disso.

Alberto João Jardim está livre e, já o disse, quer continuar na vida política activa.Seria um desperdício se o não fizesse. Fá-lo-à decerto como membro do PSD - maior defeito dele porque este PSD está longíssimo do PPD que ele estreou - e irá maia uma vez ajudar o partido a conseguir um resultado mais satisfatório, malgrée todas as burrices que os seus governantes têm feito ao longo dos anos.

Tudo isto para dizer que entre os putativos candidatos- todos eles já mais do que testados pelas estradas da política comos resultados por nós conhecidos e sofridos-desde o incansável e hesitante perdedor que é Marcelo-comentador, até Santana Lopes - agora bem aconchegado na Santa Casa -    passando pelos "nins" de Durão e Guterres, candidatos é o que não falta! Mas que provas temos das suas capacidades se uns nem lá chegaram e outros nos conduziram onde hoje jazemos?

Penso, e não tenho sobre isso dúvidas, que ALBERTO JOÃO JARDIM será, se se candidatar,o único candidato à PRESIDÊNCIA DA REPÙBLICA com provas dadas na área da governação e com objectivos plenamente claros e compreensíveis.

Claro que não será fácil romper na camarilha política que se entreteceu para lá de ideologias, procurando apenas os seus próprios interesses - sempre inconfessáveis, porque ou não os dizem ou mentem quando os dizem - e estando-se nas tintas para Portugal e para o seu Povo. Aparecerão grupos popularuchos reivindicando uma monarquia que, ainda que se seja monárquico, ninguém sabe ao que vem, aparecerão as aderências do soarismo e do cavaquismo e tudo isso se conciliará em quem prometer reformar uma lei, beneficiar um municipio, conceder um ministério à mana. Alberto João detesta os socialistas e não nutre maior apreço pelo CDS. Os pequenos partidos que se têm vindo a formar prestariam um enorme favor ao País ao País se apoiassem

                                    ALBERTO JOÂO JARDIM À PRESIDÊNCIA DA REPÙBLICA!

dadas e com a genica de quem sabe determinar um rumo e fazê-lo Vingar.

 

 

 

 

A CEGONHA

Sábia nos seus objectivos a Natureza tratou de que fazer um filho fosse, em situações consentidas, um momento de prazer e que os intervenientes no processo não soubessem que estavam a fazer uma criança embora conscientes de que do acto tal poderia resultar.

Até há algumas décadas a esta parte - antes da descoberta das diversas pílulas, dos perservativos, dos laqueamentos de trompas, dos vários dispositivos que perservam a mulher em relação a uma gravidez indesejada e de muitas outras coisas que desconheço - as mulheres, embora fosse possível que uma virgem de trinta anos soubesse menos sobre o facto do que hoje uma garota de sete anos , sabiam que de uma ligação fisicamente intíma com um homem poderia resultar uma gravidez.

Com os homens a coisa era diferente. O assunto era delas. A Natureza se encarregara de lhes por no ventre por nove meses e vários incómodos um pequenino habitante que um dia, sabiam lá elas, tanto poderia vir a ser um triste como um grande homem. E, diga-se, o nascimento da criança estava longe, por melhor que corresse, do momento grandioso que lhe dera origem

Conheci, e conheço, várias mulheres que, umas de bom grado e sem o menor desejo ou necessidade de partilhar o filho, outras com muita revolta e sacrifício, se assumiram como mães solteiras e nem quiseram que eles perfilhassem as crianças. Dantes era um estigma, hoje, felizmente, já não é,

 Com as criadas isso, em certas casas, era frequentíssimo. "Elas" eram um lugar limpo para os meninos iniciarem a sua actividade sexual e, se a coisa corresse mal e "ela" engravidasse de duas uma: ou lhe arranjavam um marido a quem arranjavam emprego para que casasse e perfilhasse a criança como sendo dele ou, muito simplesmente mandavam a rapariga embora acusando-a de estar a criar uma situação desagradável por puro oportunismo.

Claro que tudo isto se passava quando não havia televisão, e os bebés chegavam de Paris no bico de uma cegonha já de fralda posta e chucha na boca. Hoje todas as crianças sabem tudo desde a mais tenra infância e se os pais não as industriarem o Estado encarrega-se de o fazer. Não há hoje, creio, ninguém, homem ou mulher com mais de dez anos, que não conheça as potenciais consequências de um acto sexual. O que pode faltar, isso sim, é a educação deles ir no sentido de explicitar os sarilhos que podem resultar dessa displescência.

Vem isto a propósito de dois casos em que devido a impulsos momentaneos se desfizeram dois casamentos felizes. Um que já levava quase quarenta anos de matrimónio e vários filhos e netos, outro o de um jovem casal com poucos meses de casados e estando a esposa com oito meses de gravidez e todos, pais, avós, e irmãos, felicissimos naquela espera.

Eis senão quando, em ambos os casos - no primeiro uma secretária que há mais de dez anos, ao que consta, consolava o senhor ao sábado, dia em que a mulher ficava com os netos e ele ficava livre para ir "para a Versailles ler os jornais, encontrar-se com os amigos e almoçar por lá ou em sítio sugerido por algum dos comparsas de tertúlia", a outra que, também ao que consta, mal soube que ele ia casar nos próximos meses - rapaz muito respeitador da noiva que, por sua vez, jamais conhecera qualquer atrevimento da parte dele- começou a chegar-se muito a ele e, numa noite de vela na clínica em que trabalhavam, ZUCA!, apanhou-o decerto sem grande dificuldade (noite, homem apaixonado - mesmo não sendo por ela...- e o corpos ali, sem quem lhes acudisse, nem sequer uma urgência...). Em ambos os casos as "piquenas" ficaram grávidas e, em ambos os casos os homens ficaram aterrados sem saber como desfazer o que tinham feito e que elas, graças a Deus, se recusavam a desfazer. Depois de muitas discussões, no segundo caso envolvendo os pais da jovem profissional que terão visto no caso mais uma oportunidade do que um acidente previsivel, surgiu a ameaça do fatal teste de ADN. Ambos os homens recusaram mas a verdade é que o consentimento deles não era sequer necessário. Ambas estavam dispostas a ir em frente. E foram! E ambos os casamentos terminaram ali, um transformado em escandalo familiar, outro culminando numa tremenda desilusão e, com o apoio dos pais da jovem noiva e recente mãe, disposta a não querer por-lhe mais os olhos em cima e a criar sozinha a criança.

Justa sentença, diremos, para os homens aprenderem que não podem andar para aí, desleixados e precipitadamente, sem se informarem primeiro - caso elas queiram dizer a verdade... - se elas estão protegidas ou de se protegerem eles. Contudo...

...há que ver o outro lado da coisa. Na melhor das hipóteses nenhum deles entra no jogo com a preocupação de que pode ter um filho! Quanto aos homens é mesmo uma certeza! Ambas sabiam que eles eram comprometidos.Um já avô, o outro a dois passos do casamento no fim de uma namoro de dois anos. É dificil pensar aquilo que talvez - quem sabe...- elas tenham pensado. Para uma o filho é uma reforma melhorada e a companhia garantida, para a outra era uma maneira de caçar um jovem clínico especializado numa universidade dos Estados Unidos e filho de gente bem e com bens. 

Foram dois natais estragados para várias pessoas e ambos. embora perfilhando as crianças e terem que ficar - legitimamente porque as crianças não tinham tido culpa de terem sido feitas assim "á vol d'oiseau" - a pagar pensão para o sustento e educação das crianças.

Tudo justíssimo! Mas ocorre-me perguntar: não terão os homens também razão para se queixarem de os terem feito pais sem primeiro se informarem se eles queriam correr esse risco? A solidariedade do acto só existe durante a execução do mesmo? Porque se podemos no mínimo dizer que, pelo menos no caso do jovem médico, eles foram imprudentes porque sabiam que tal podia acontecer, que dizer delas? Será que ainda acreditavam na cegonha? E, provavelmente, no Pai Natal...

Que estas coisas se passem com homens livres que apenas evitam responsabilidades pessoais admite-se.  Mas que se estraguem famílias, sem dó nem piedade, porque as tais "mulheres libertas" se esqueceram de avisar que não tinham tomado a pilula naquele dia ou que nunca a tinham tomado, é pura maldade. Para o homem, que acaba sendo um "anjinho" vestido de diabo, para as famílias, e até para as crianças que já nascem com uma complicada história a precedê-las. 

De "O BANQUEIRO ANARQUISTA"

"Como podia eu tornar-me superior à força do dinheiro? O processo mais simples era afastar-me da esfera da sua influência, isto é, da civilização: ir para um campo comer raizes e beber água  das nascentes, andar nu e viver como um animal. Mas isto, mesmo que não houvesse dificuldade em fazê-lo, não era combater uma ficção social; não era mesmo combater; era fugir. Realmente quem se esquiva a travar um combate não é derrotado nele. Mas moralmente é derrotado porque não se bateu. O processo tinha que ser outro - um processo de combate e não de fuga.

Como subjugar o dinheiro combatendo-o? Como furtar-me à sua influência e tirania não evitando o seu encontro? O processo era só um - adquiri-lo, adquiri-lo em quantidade bastante para não lhe sentir a influència: e em quanto mais quantidade o adquirisse, tanto mais livre estaria da sua influência, Foi quando vi isto claramente, com toda a força da minha convicção de anarquista, e toda a minha lógica de homem lúcido, que entrei na fase actual - a comercial e bancária, meu amigo - do meu anarquismo.

(...)

- Porque escolheu vocè esta fórmula extrema e não se decidiu por qualquer das outras... das intermédias?...

- Eu lhe digo. Eu meditei tudo isso. É claro que nos folhetos que eu lia havia todas essas teorias. Escolhi a teoria anarquista - a teoria extrema como você muito bem diz - pelas razões que lhe vou dizer em duas palavras.

Ficou um momento coisa nenhuma. Depois voltou-se para mim.

- O mal verdadeiro, o único mal, são as convenções e as ficções sociais, que se sobrepôem às realidades naturais - tudo, desde a família ao dinheiro, desde a religião ao estado. A gente nasce homem ou mulher - quero dizer nasce para ser, em adulto, homem ou mulher, não nasce , em boa justiça natural, nem para ser  marido, nem para ser rico ou pobre, como também não nasce para ser católico ou protestante, ou português ou inglês. É todas estas coisas em virtude das ficções sociais. Ora essas ficções sociais são más porquê? Porque são ficções, porque não são naturais! Se houvesse outras, que não fossem estas, seriam igualmente más, porque também seriam ficções, porque também se sobreporiam e estorvariam as realidades naturais.

(...)

-Qual é a ficção mais natural? Nenhuma é natural em si, porque é ficção. A mais natural, neste nosso caso, erá aquela que pareça mais natural, aquela que estamos habituados. (Você compreende: o que é natural é o que é do instinto: e o que, não sendo instinto, se parece em tudo com o instinto é o hábito, Ora qual é a ficção social que constiui um hábito nosso? É o actual sistema, o sistema burguês!"

 

Fernando Pessoa, editorial Nova Ática

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